IMS Paulista inaugura exposição do fotógrafo Evandro Teixeira, com imagens tiradas durante as ditaduras militares no Chile e no Brasil

No dia da inauguração da mostra (21/3), haverá um debate com o fotógrafo, a jornalista Dorrit Harazim e o curador Sergio Burgi. Com entrada gratuita, a exposição Evandro Teixeira, Chile 1973 apresenta as imagens que Evandro produziu durante a cobertura do golpe militar no Chile, em 1973, com destaque para os registros do enterro do poeta Pablo Neruda. A mostra traz ainda fotos feitas no período da ditadura militar no Brasil. Paralelamente, também a partir de 21/3, a Biblioteca de Fotografia do IMS Paulista apresenta a mostra Papel, tinta e chumbofotolivros e ditaduras sul-americanas

Um dos principais nomes do fotojornalismo brasileiro, Evandro Teixeira (1935) atuou na imprensa por quase seis décadas, sendo 47 anos no Jornal do Brasil. Com suas lentes, registrou os bastidores do poder no país, em especial as manifestações contrárias ao regime militar, além de temas associados ao esporte, à moda e à cultura. Em sua carreira, participou ainda de uma importante cobertura internacional: a do golpe militar no Chile em 1973. No país andino, produziu imagens impactantes do Palácio De La Moneda bombardeado pelos militares, dos prisioneiros políticos no Estádio Nacional em Santiago e do enterro do poeta Pablo Neruda.

As fotografias tiradas durante esse capítulo traumático da história chilena são o destaque da exposição Evandro Teixeira, Chile, 1973, em cartaz a partir de 21 de março (terça), na sede de São Paulo do Instituto Moreira Salles (av. Paulista, 2424). No dia da abertura (21/3), às 18h, haverá um bate-papo com o fotógrafo, a jornalista Dorrit Harazim, que também esteve no Chile no mesmo período, e o curador da mostra, Sergio Burgi, coordenador de fotografia do IMS. A entrada para a conversa é gratuita, com retirada de senhas 1 hora antes (confira no serviço).

A mostra reúne cerca de 160 fotografias em preto e branco, livrosfac-símiles e outros objetos, como máquinas fotográficas e crachás de imprensa. Além dos registros feitos no Chile, a exposição traz imagens produzidas por Evandro durante a ditadura civil-militar brasileira, em um diálogo entre os contextos históricos dos dois países. Em monitores dispostos pelo espaço expositivo, também são apresentados trechos de filmes que documentam o período, como Setembro chileno, de Bruno Moet, e Brasil, relato de uma tortura, de Haskell Wexler e Saul Landau​​.

Evandro, cujo acervo está sob a guarda do IMS, viajou para o Chile em setembro de 1973, no dia seguinte ao golpe militar de 11/9 que levou à morte do presidente eleito Salvador Allende. O fotógrafo foi como correspondente do Jornal do Brasil, acompanhado pelo repórter Paulo Cesar de Araújo. Retido com dezenas de outros correspondentes internacionais na fronteira da Argentina com o Chile, fechada deliberadamente pela junta militar chilena, chegou a Santiago em 21/9. Sob a vigilância dos militares, a imprensa internacional circulava por uma cidade sitiada e ocupada pelas forças militares, com rígido toque de recolher. Além de contornar a censura local, Evandro precisava revelar as imagens rapidamente em um pequeno laboratório improvisado, que instalou no banheiro do seu hotel, e transmiti-las em seguida usando um aparelho de telefoto.

Entre as imagens produzidas nesse período, o registro mais importante feito pelo fotógrafo, que ele mesmo considera um dos marcos de sua carreira, foi a da morte e enterro do poeta Pablo Neruda. Um dia depois de chegar a Santiago, Evandro soube pela esposa de um diplomata que Neruda estava hospitalizado em uma clínica da cidade. O fotógrafo foi até o local, mas não conseguiu registrar o escritor, que morreu na noite daquele mesmo dia. Na manhã seguinte, retornou à clínica, já ciente da morte, e conseguiu acesso ao interior do edifício por uma entrada lateral, chegando ao local onde Neruda estava, em uma maca no corredor, sendo velado por sua viúva, Matilde Urrutia. Em entrevista para o site do IMS, o fotógrafo relembra o episódio: “Estou lá, rondando o hospital, e de repente abre uma porta lateral, olho, tiro a Leica, sempre deixo preparada para dois metros, o que der, deu. Entro, Neruda está na maca, dona Matilde, sua mulher, sentada com o irmão dela.”

Evandro fez a foto e, em seguida, pediu permissão para a viúva, lembrando que havia fotografado Neruda anteriormente, em um encontro com o escritor Jorge Amado no Brasil. Matilde não só permitiu que ele fizesse os registros como pediu para acompanhá-la até a residência do casal, La Chascona, onde o corpo seria velado. “Dentro da clínica fiz a maca, fiz várias fotos, apavorado. Eu olhava em volta, pensava naquele mundo de fotógrafos em Santiago e dizia pra mim mesmo: não, não é possível, só eu aqui, só eu?”, relembra. Evandro registrou naquele dia e no seguinte detalhadamente todas as etapas do velório e enterro do poeta, que contou com grande participação popular e se tornou o primeiro grande ato contra o governo de Pinochet.

Evandro foi, assim, o único fotojornalista a registrar Neruda ainda na clínica, logo após seu falecimento, que hoje, de acordo com estudos recém-publicados, parece ter sido causado por envenenamento. O curador Sergio Burgi comenta a importância dessa série de imagens, principal destaque da exposição: “Esta é uma documentação excepcional e em grande parte ainda inédita, oriunda da obstinação e audácia de um fotojornalista brasileiro que conseguiu penetrar incógnito no hospital onde se encontrava o corpo do poeta que admirava e conhecera no Brasil”.
A exposição também traz imagens que Evandro realizou no Estádio Nacional do Chile, local onde o governo encarcerou e torturou inúmeros presos políticos. Os correspondentes foram levados pelos próprios militares para fotografar o local, em uma iniciativa oficial que visava a encobrir as violações de direitos humanos que aconteciam ali. Ainda assim, Evandro e outros colegas conseguiram driblar o cerco e registrar tanto a chegada não planejada pelos militares de novos presos políticos ao estádio como também penetrar no subsolo do local, onde jovens estudantes foram fotografados sendo conduzidos para áreas internas. Junto aos registros do Estádio Nacional, há também imagens que mostram a violência militar em Santiago, como a foto do Palácio De La Moneda bombardeado.
Em outro núcleo, a mostra apresenta fotos feitas por Evandro durante a ditadura brasileira e que hoje fazem parte do imaginário sobre o período. Entre elas, estão a da Tomada do Forte de Copacabana, feita exatamente no dia 1 de abril de 1964, as imagens das manifestações contrárias ao governo, em 1968, como a da Passeata dos Cem Mil, vetada pelos censores da época por registrar a faixa “Abaixo a ditadura, povo no poder”, ou ainda a foto na qual Evandro registra a queda de um motociclista da FAB, em 1965. Junto aos registros, há uma cronologia da carreira do fotógrafo, além de depoimentos em vídeo em que relembra momentos marcantes de sua trajetória.

Para Sergio Burgi, o conjunto de imagens reforça a importância da prática diária do fotojornalismo como ferramenta de fiscalização do poder e preservação da memória: “A obra de Evandro Teixeira é expressão plena deste compromisso do fotojornalismo com o testemunho direto da realidade e com a liberdade de expressão e criação, essenciais tanto em nosso passado recente como ainda hoje. Passadas cinco décadas, suas imagens sobre as ditaduras militares no Chile e no Brasil reafirmam claramente a importância da democracia e do respeito absoluto ao estado de direito e à cidadania. São imagens que claramente desnudam o autoritarismo e permanecem denunciando, ainda nos dias de hoje, de forma clara e cristalina, os riscos das aventuras golpistas.”

Em cartaz até julho, a mostra também contribui para a reflexão sobre a extensa obra de Evandro Teixeira, profissional comprometido sobretudo com seu ofício, como revelam suas palavras: “Minha aventura pessoal identifica-se com a aventura vivida pelo mundo. Não tenho méritos para isso, sou um homem manejando uma câmera. Quando bem operada, é um fósforo aceso na escuridão. Ilumina fatos nem sempre muito compreensíveis. Oferece lampejos, revela dores do impasse do mundo. E desperta nos homens o desejo de destruir esse impasse.”

Exposição simultânea na Biblioteca de Fotografia
Entre 21 de março e 11 de junho, a Biblioteca de Fotografia do IMS Paulista, em diálogo com as fotos de Evandro Teixeira, apresenta a mostra Papel, tinta e chumbo: fotolivros e ditaduras sul-americanas, composta de publicações que abordam as ditaduras militares ocorridas na América do Sul entre os anos 1960 e 1980. Os títulos apresentados mostram como fotógrafos e artistas documentaram os acontecimentos no momento em que aconteceram ou como os rememoraram depois, muitas vezes se valendo de álbuns familiares e arquivos públicos. Nas páginas dos livros, encontram-se a iminência dos golpes de Estado, a atuação da repressão, o cotidiano possível, os dramas familiares, as greves e as lutas de resistência, os lugares indizíveis, o exílio, as dissidências ocultas e os efeitos da ausência dos desaparecidos. Entre os livros apresentados na mostra estão A greve do ABC, de Nair Benedito, Juca Martins e Eduardo Simões et al (Brasil); La manzana de Adán, de Paz Errázuriz (Chile); e Una sombra oscilante, de Celeste Rojas Mugica (Argentina), entre muitos outros.

Sobre o catálogo

O IMS lançará um catálogo da exposição. A publicação trará, além das fotografias presentes na mostra, textos da cientista política, socióloga e professora Maria Hermínia Tavares de Almeida, do escritor Alejandro Chacoff e do curador da exposição, Sergio Burgi, e uma cronologia organizada pela pesquisadora Andrea Wanderley. O catálogo tem previsão de lançamento para o dia da abertura da exposição.

 

Serviço

Exposição Evandro Teixeira, Chile 1973

Abertura: 21 de março

Visitação: até 30 de julho

6º andar

IMS Paulista

Entrada gratuita

Curadoria: Sergio Burgi

Assistência de curadoria: Alessandra Coutinho

Pesquisa biográfica e documental: Andrea Wanderley

Pesquisa no acervo: Alexandre Delarue

Conversa sobre a exposição Evandro Teixeira, Chile, 1973, com Evandro Teixeira e a jornalista Dorrit Harazim. Mediação de Sergio Burgi.

21 de março, terça-feira, 18h, no cineteatro do IMS Paulista

Entrada gratuita. Distribuição de senhas 60 minutos antes do evento.

Limite de 1 senha por pessoa.

Capacidade do cineteatro: 145 lugares.

Evento com interpretação em Libras (Língua Brasileira de Sinais).

Exposição Papel, tinta e chumbo: fotolivros e ditaduras sul-americanas

Abertura: 21 de março

Visitação: até 11 de junho

1º andar

IMS Paulista

Entrada gratuita

 

IMS Paulista

Avenida Paulista, 2424

São Paulo, SP

Entrada gratuita

Horário de funcionamento: Terça a domingo e feriados (exceto segundas), das 10h às 20h

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